Autor: George Wootton , do Instituto da Automação
Se você segue mais de perto as novidades da Automação Residencial e Casa Conectada, você deve ter ouvido falar do MATTER. Se você ainda não ouviu falar dele, se prepare, pois, é um assunto que deve perdurar por um bom tempo ainda.Resumindo de forma quase inconsequente, MATTER é uma
proposta de desenvolver um conjunto de protocolos e serviços que permita que
todo e qualquer dispositivo de Casa Conectada possa se comunicar em um mesmo
universo, sem depender de marca ou modelo. Seria mais ou menos como nossa
internet, onde os mais variados dispositivos das mais variadas marcas se
comunicam sem dificuldades.
Como consequência, o MATTER oferece a possibilidade de
simplificação na instalação, configuração, integração e uso de equipamentos
para a Casa Conectada. Não interessa de que marca ou a qual plataforma o
dispositivo pertença, ele conseguiria conversar com todos os outros
dispositivos que também utilizassem MATTER.
Um sistema único, intercambiável, altamente integrável, mais
seguro e menos dependente da nuvem. Isso é o que nos promete o MATTER.
Simplificando em muito a história, o MATTER nasceu dentro da
Zigbee Foundation como uma forma de tentar homogeneizar a conectividade entre
dispositivos da Casa Conectada, a proposta original do Zigbee, mas que não foi
seguida a fundo pelos fabricantes. O MATTER seria uma forma de “consertar” e
aprimorar os conceitos do Zigbee (você pode obter todos os detalhes no site Matter – CSA-IOT)
A ideia logo se tornou popular entre os fabricantes e o
MATTER começou a ganhar adeptos de peso, com Google, Amazon, Apple e Microsoft
(até a Z-Wave Foundation, concorrente direta do Zigbee, faz parte!).
Rapidamente começaram a criar os comitês e a escrever as especificações e tudo
indicava que o MATTER estaria no mercado já em 2022.
Contudo, não foi bem assim que aconteceu. O desenvolvimento
não seguiu o ritmo esperado e agora no segundo semestre de 2023 temos apenas alguns
produtos que oferecem MATTER como uma opção de comunicação. E o futuro a curto
prazo não parece muito promissor.
Mas o que está dando errado?
Primeiramente precisamos entender que no mundo da tecnologia
existem duas formas de se estabelecer um “padrão”. A primeira é por normas e
diretrizes e a segunda é por dominância de uma certa tecnologia no mercado que
a acaba tornando o “padrão de fato”.
Então simplesmente criar um padrão e querer impô-lo ao
mercado pode ser um processo lento e doloroso. Muito provavelmente os
fabricantes irão criar suas próprias versões do padrão para poderem se destacar
no mercado e oferecer funcionalidades não inicialmente consideradas pelo
“padrão”.
Um caso típico é o Zigbee. Existe sim uma certa
interoperabilidade e intercambialidade entre os fabricantes, mas sempre temos
algumas dores de cabeça no processo. Um interruptor de 3 canais da plataforma
Tuya pode aparecer como um único “objeto" quando conectado diretamente ao Zigbee
do Echo da Amazon. Um sensor de temperatura e umidade pode mostrar apenas a
temperatura quando conectado a um gateway de outra plataforma.
O primeiro deles é a sua limitação de funcionalidades. Por
ser um padrão novo e querendo entrar no mercado o mais rapidamente possível,
ele limitou nas suas primeiras versões as funcionalidades que seriam
padronizadas. Assim, o MATTER permite ligar e desligar uma tomada, mas não está
preparado para receber informações de consumo. De certa forma, o MATTER nivela
por baixo a equiparação dos produtos sem deixar espaço para os diferenciais que
cada fabricante queira oferecer.
Então, porque eu, consumidor, iria me interessar pelo
MATTER? Ele oferece menos que uma plataforma dedicada como a Tuya! E se eu não
me interesso, vai ser difícil o fabricante se interessar também. A solução que
o mercado tem encontrado é continuar a usar o WiFi ou o Zigbee como principais
formas de comunicação e oferecer um gateway que “transportaria” as informações
para o mundo MATTER.
O segundo deles é sua limitação em tipos de dispositivos. O
MATTER foi inicialmente lançado apenas para lâmpadas, interruptores, tomadas,
aparelhos de ar-condicionado, sensores de movimento e de abertura e
armazenamento de mídia. Para um primeiro lançamento parece ótimo, ainda mais
que prometeram novas versões a cada seis meses onde incluiriam novos tipos de
dispositivos. Contudo, não foi o que aconteceu. A versão 1.1 do MATTER veio
tarde e apenas para corrigir erros. A lista inicial de dispositivos até que é
decente, mas ela precisa crescer rapidamente, ou corre o risco de não conseguir
adeptos.
Um último ponto que merece atenção é o fato de que os grandes players do mercado já sentiram que não precisam aderir, pelo menos de imediato, ao novo padrão. Em geral estes players têm uma lista extensa de produtos e adaptá-los para o MATTER seria um investimento que poderia ser feito mais à frente, depois de comprovada a adesão do mercado ao novo padrão.
E as startups, ávidas por trazerem como diferencial novas tecnologias, não têm o folego para lançarem produtos com MATTER e esperar o mercado esquentar para começarem a ter vendas significativas. Infelizmente, no mundo da Casa Conectada, o consumidor adepto a riscos e inovações ainda não sancionadas pelos grandes players é um grupo muito pequeno.Em resumo, temos nas mãos um conceito de padronização que
promete o que todo consumidor quer: intercambialidade, interoperabilidade,
simplificação e integração. Mas a consequência natural disso é a
“comoditização” de produtos, não havendo diferenciais significativos entre os
produtos a não ser o preço e a qualidade industrial do produto.
Minha receita de sucesso para o MATTER é ele ser capaz de
abraçar a necessidade de permitir os diferenciais de cada fabricante. Não é
simples, mas é plenamente possível, bastando abrir mão da simplicidade no
desenvolvimento em troca de uma abrangência mais universalizada.
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Leia também nosso artigo sobre o lançamento oficial do MATTER em novembro de 2022